É preciso pensar as contratações na área pública dentro da lógica da inovação, o que demanda a reformulação de entendimentos tradicionais e a adoção de novas soluções jurídicas. É o que defendem os advogados Carolina Mota Mourão, Maria Edelvacy Marinho e Vitor Monteiro, do núcleo jurídico do Observatório de Inovação e Competitividade (OIC), um grupo de apoio à pesquisa ligado ao Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP.
O trio analisou, para o Jornal da USP, a contratação da Microsoft pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, para a criação de um sistema judicial eletrônico feito em nuvem para processos de primeira e segunda instâncias. O acordo está suspenso pelo Conselho Nacional de Justiça sob justificativa de que a corte não seguiu resolução do órgão para implementar o sistema e contratou uma empresa estrangeira para fazer serviços para um órgão público.
De acordo com os especialistas, o caso envolve a Lei de Licitações e Contratos (8.666/93). Maria Edelvacy Marinho defende que as estruturas jurídicas não estão adaptadas ao que a inovação exige. “Não vemos o jurídico como um entrave, mas como um instrumento. Só precisamos entender como ele tem sido utilizado e quais contribuições podemos dar para ter mais de debate que gere segurança jurídica quando estamos falando de inovação”, afirma.
Edelvacy entende que o problema de segurança dos dados brasileiros em uma empresa estrangeira já foi "desmistificado". “Estamos falando de um novo padrão tecnológico. Não faz muito sentido, do ponto de vista econômico, ser mantido aqui, inclusive é uma tecnologia que bancos utilizam. Tem uma série de dados que utilizamos no Brasil e estão no sistema de nuvem”, comenta.
“Estamos diante de uma mudança cultural. Não só jurídica, mas cultural da forma de se conceber inovação no Brasil, sobretudo quando envolve dinheiro público — que existe todo um questionamento de transparência e concorrência. Mas é importante que se compreenda que, em qualquer lugar do mundo, a compra pública é um veículo de estímulo de promoção da inovação.”
Para Carolina Mota Mourão, o principal desafio é a interpretação das normas, já que a lei de inovação possibilita as contratações diretas. "Não teremos uma competição entre os agentes de mercado. Isso é permitido em duas situações: para encomendas tecnológicas — o Estado quer contratar um produto novo que envolve um certo risco — e também para contratação de produtos de pesquisa. A lei trouxe isso e eu entendo como algo bem-vindo. Agora, temos desafios. É a cultura jurídica versus a cultura de inovação”, concluiu.
Já Vitor Monteiro declara que existe consenso no país sobre a necessidade de melhorias tecnológicas no Poder Judiciário mas que não há formas de resolver esse problema. Para ele, "o Direito sempre tem derramado um óleo no chão" quando o assunto é a aplicação das tecnologias na prestação do serviço público.
Segundo o pesquisador, “a inovação da tecnologia da informação é diferente da inovação na saúde, que é diferente em segurança, por exemplo". "Como é que a gente vai lidar com esse parâmetro? E é um parâmetro que requer complexidade. E o Direito é quase sempre avesso à complexidade.” Com informações de Pedro Ezequiel, do Jornal da USP.
Fonte: Conjur
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